Suspensão
de posse de ministra não deveria ser questão jurídica
ELOÍSA
MACHADO DE ALMEIDA Professora e Coordenadora
do Supremo em Pauta FGV Direito SP
ESPECIAL PARA A FOLHA
ESPECIAL PARA A FOLHA
09/01/2018
16h10
A decisão liminar que suspendeu a posse de
Cristiane Brasil como ministra usa como fundamento a moralidade administrativa.
Para o juiz, a nomeação de uma pessoa condenada na Justiça do trabalho para o
cargo de ministra do Trabalho não seria razoável; mais do que isso, seria grave
e inconstitucional.
Ocorre que a Constituição Federal
oferece os parâmetros para essa moralidade administrativa em vários artigos,
impondo, por exemplo, a inelegibilidade e a perda de mandato para os condenados
definitivos por crimes ou por improbidade (art. 15, 3 e 5); restrições a
eleições de parentes de políticos (art.14, §7º); o afastamento do cargo de um
presidente que se torne réu ou que cometa crime de responsabilidade (art. 86,
§1º e 85). Se não oferece os parâmetros, manda que a lei o faça –como na Lei da
Ficha Limpa.
Porém, na indicação de ministros
de Estado, a Constituição exige apenas a idade mínima de 21 anos e o pleno
exercício dos direitos políticos (art. 87). Ou seja, pelos parâmetros
constitucionais, trata-se de um cargo de livre nomeação e exoneração, um poder
conferido ao presidente da República (art. 84, 1) de escolher sua equipe de
governo.
Não há nenhuma vedação
constitucional a que condenados no âmbito civil ou trabalhista ocupem cargos
ministeriais, assim como não há nenhuma vedação para que um réu ou investigado
o faça.
A questão aqui, portanto, não
deveria ser jurídica. É uma questão política e, politicamente, poder-se-ia
cogitar que apenas um presidente sem nenhuma popularidade –e que por
isso não se importa com a opinião pública– teria a pachorra de indicar tal
figura para compor um ministério que, cá entre nós, já não guarda grande
reputação.
Mas o tema se tornou jurídico a
partir do momento em que um juiz decidiu criar novos parâmetros sobre a
moralidade administrativa. Mas esse não é um caso isolado. Na verdade, pode-se
afirmar que o Judiciário vem impondo uma agenda de moralização judicial da
política, muitas vezes à revelia do que diz a lei.
Um conjunto de decisões dos
últimos anos revela uma visão bastante particular de como os juízes enxergam a
política: algo eminentemente ruim, imoral e viciado. Foi assim quando o STF
julgou o financiamento privado de campanhas; quando aprovou a restrição à fusão
de partidos na minirreforma eleitoral de 2015; quando implantou a execução da
pena sem trânsito em julgado da condenação; quando afastou Eduardo Cunha da presidência da Câmara
dos Deputados ou quando acenou que réus não poderiam ocupar cargos na linha
sucessória da Presidência da República, sem esquecer o veto à posse de Lula.
O combustível dessa agenda é a
Operação Lava Jato que, se por um lado tem o enorme mérito de revelar a
corrupção de empresários e políticos, por outro tem servido de pretexto para
blindar os abusos do Judiciário. Basta carimbar uma medida como "contra a
Lava Jato" para decretar seu fim: veja o debate sobre os supersalários dos
juízes ou o indulto do Natal.
Ninguém ignora o altíssimo nível
do mar de lama que banha nossa classe política; há muitas razões para críticas
contundentes, propostas de reforma e ansiedade por novas eleições. Mas nada autoriza
que o Judiciário atue fora das regras por aí, cassando mandatos e ou nomeações.
Não há saída fora da
Constituição.
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