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13 de
dezembro de 2014
Até
quando?
Publicado por Leandro
Falavigna - 2 dias atrás
A redação final da proposta que estabelece o
direito de crianças e adolescentes serem educados sem o uso de castigos físicos
(PL 7.672/10) foi aprovada pela CCJ da Câmara.
Referida proposta estabelece que os pais ou
responsáveis que se utilizarem de castigo físico ou tratamento cruel e
degradante contra criança ou adolescente ficarão sujeitos a advertência,
encaminhamento para tratamento psicológico e cursos de orientação, independentemente
de outra sanções.
Tal proposta anteriormente chamada "Lei da
Palmada" é agora “festejada” como “Lei Menino Bernardo”, num claro
contorno apelativo e populista.
Mas qual a real necessidade dessa nova Lei? Será
que não dispúnhamos de leis capazes de evitar e punir a tragédia havida no Rio
Grande do Sul? Pode o Estado interferir de tal forma na educação de nossos
filhos?
Estamos sendo enganados! Mais uma vez...
O Estado não pode e não deve interferir de tal
forma na educação de nossos filhos. O importante em uma educação é transmitir
valores e princípios, com limites e sem abusos. Ocorre que os abusos já são
coibidos por nossa legislação penal. Não há necessidade de mais um projeto,
mais uma lei.
Nesse sentido, já existem tipos penais como, por
exemplo, o de lesão corporal (artigo 129, parágrafo 9º, do Código Penal, com a agravante do artigo 60, letra h, se praticada contra criança),
abandono material (artigo 244 do Código Penal) e abandono intelectual (artigo 246 do Código Penal), que podem e devem ser utilizados para situações
como a do menino Bernardo.
O novo projeto, portanto, não passa de puro
populismo e demagogia de um Estado altamente intervencionista, legiferante e
omisso.
O que se vê atualmente são diversas minirreformas
que não passam de remendos muito mal feitos e que não resolvem o problema.
A pergunta que fica é: mas se o projeto é um
equívoco e nossa legislação já era capaz de coibir abusos, porque não salvamos
Bernardo?
Esse é o âmago do problema. Fazer novas Leis não é
solução. Bernardo morreu porque nosso sistema judiciário como um todo está
falido. Há uma ineficiência completa de nosso sistema penal que só estimula a
certeza da impunidade. E esse é um ciclo vicioso que precisa ser quebrado
rapidamente.
Vale lembrar que há muito nossas autoridades já
tinham conhecimento do caso do menino Bernardo. Além de uma ação judicial
proposta pela avó do menino, Bernardo chegou a fugir de casa para ir ao Fórum
clamar por socorro diretamente à representante do Ministério Público. E o que
foi feito? Nada.
As autoridades já sabiam do problema e já dispunham
de instrumentos legais para agir, mas não fizeram nada. Vir agora chamar a Lei
da Palmada de Lei Menino Bernardo é um verdadeiro desrespeito para com a
memória dessa criança.
Nossa justiça está abarrotada e sem estrutura
física e de pessoal mínimas para exercer o seu papel. O Poder Judiciário como
um todo precisa de investimentos que permitam que as Leis já existentes sejam
aplicadas. Se nossos governantes se concentrassem em fazer isso, já seria
muito.
Concomitantemente a esses investimentos, é preciso
também incutir na cabeça dos servidores públicos – especialmente nas cabeças
dos mais graduados – que eles estão prestando um serviço à população. Com
efeito, aquele que não estiver desempenhando bem o seu papel deve ser
individualmente responsabilizado por isso. Não se pode mais aceitar que nossas
autoridades escondam-se na falta de estrutura e a usem como desculpa para
prestarem um mal serviço à população.
Mais. Enquanto não tivermos uma polícia preparada,
treinada, atuante e incentivada; enquanto nosso Judiciário estiver agonizando,
abarrotado e clamando por investimentos e funcionários em número e qualidade;
enquanto nossas autoridades continuarem usando como desculpa a falta de
estrutura para se eximirem da responsabilidade de prestar um bom serviço;
enquanto não fizermos uma reforma legislativa fundada em uma política criminal
que abandone o conceito “maternalista” da atual legislação, decididamente, não
seremos capazes de salvar “nossos Bernardos”.
Aprovar um projeto esdruxulo como o proposto não é
solução. É mais um engodo. A raiz do problema deve ser atacada pra valer, sob
pena de tudo continuar como está.
26 de maio de 2014, Luís Carlos Dias Torres e
Leandro Falavigna, advogados criminalistas.
Advogado criminalista, formado em Direito pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 2003, especialista em
Direito das Relações de Consumo pelo Curso de Especialização, Aperfeiçoamento e
Extensão da PUC-SP (COGEAE). Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal
também pela PUC...