Indulto de Natal e saída temporária: não confunda!
Eudes
Quintino de Oliveira Júnior e Antonelli Antonio Moreira Secanho
domingo,
22 de dezembro de 2013
Todos os anos, quando se aproxima
o Natal, a imprensa se encarrega de anunciar que diversos detentos poderão
passar as festas de final de ano fora do presídio, em razão do "indulto de
Natal" a eles concedido.
Quem é detentor do conhecimento técnico-jurídico
não pode incidir no equívoco cometido pelas denominações confusas que aparecem
nos noticiários. Operadores do Direito devem se atentar às grandes diferenças
que existem nestas saídas temporárias dos detentos, seja no final do ano ou
não.
Desta feita tem-se, de um lado, o indulto natalino,
que se trata de um verdadeiro perdão aos condenados por determinados crimes,
ensejando a extinção de suas penas. O preso sai do estabelecimento prisional
para nunca mais voltar, porque extinta está sua pena. Tornou-se tradição o
chefe do Executivo Federal conceder indulto coletivo em épocas natalinas,
conforme permitido no artigo 84, XII da Constituição Federal.
Verifica-se, portanto, tratar-se de evidente
instrumento de política criminal, em que o presidente da República pode
determinar que certos crimes cometidos possam ser perdoados e todos os que por
eles respondam tenham suas penas extintas. É de se destacar que, uma vez
expedido o decreto presidencial de indulto natalino, os juízes das varas das
execuções penais são obrigados a acatá-lo.
Apenas a título de exemplo, cita-se o decreto
7.873, de 26 de dezembro de 2012, editado pela presidente Dilma Roussef,
concedendo indulto natalino a pessoa: Art. 1º, I: condenadas a pena
privativa de liberdade não superior a oito anos, não substituída por
restritivas de direitos ou multa, e não beneficiadas com a suspensão
condicional da pena que, até 25 de dezembro de 2012, tenham cumprido um terço
da pena, se não reincidentes, ou metade, se reincidentes.
Este decreto traz ainda outras previsões e, todos
os condenados que nelas se encaixarem, terão suas penas perdoadas - portanto,
extintas - não tendo mais nada a cumprir na Justiça penal.
Por outro lado, a lei 7.210/84 (lei de Execuções
Penais – LEP), em seus artigos 122 e seguintes, prevê o instituto da saída
temporária, que em nada se confunde com o indulto natalino:
Art. 122. Os condenados que cumprem pena em regime
semi-aberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento,
sem vigilância direta, nos seguintes casos:
I - visita à família;
II - freqüência a curso supletivo
profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior, na Comarca do
Juízo da Execução;
III - participação em atividades que concorram para
o retorno ao convívio social.
Parágrafo único. A ausência de vigilância direta
não impede a utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo
condenado, quando assim determinar o juiz da execução.
Não bastasse, para sua concessão, o artigo 123,
LEP, exige o cumprimento de três requisitos cumulativos: (i) comportamento
adequado; (ii) cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for
primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente; (iii) compatibilidade do benefício
com os objetivos da pena.
Insta consignar, portanto, que esta saída
temporária pode se dar em qualquer época do ano, até porque sua concessão não
pode exceder prazo superior a sete dias, com direito à renovação por mais
quatro vezes durante o ano (art. 124, LEP).
Logo, nestes casos, o condenado recluso pode sair,
porém deve retornar ao presídio no qual cumpre sua pena. Evidentemente, não se
trata de perdão, tampouco extinção da pena: verifica-se apenas a possibilidade
de autorização do condenado (não pode ser regime fechado) de sair
temporariamente do presídio para casos específicos, conforme artigo supra
citado.
Sendo assim, evidencia-se o motivo da confusão
realizada entre os institutos ora referidos. É bastante comum que os condenados
que cumpriram os requisitos da LEP solicitem ao juiz da vara das Execuções
Penais a saída temporária na época de Natal, na Páscoa, Dia das Mães. Uma vez
concedida, terá prazo determinado, sendo que, caso os condenados não regressem
ao estabelecimento prisional, cometerão falta grave (artigo 50, II, LEP).
Destarte, é comum também que, na época do Natal, o Presidente da República
conceda o indulto natalino: é o suficiente para ensejar confusão.
Sendo assim, vislumbra-se o enraizamento de uma
cultura popular, denominando a saída temporária em época de Natal de indulto
natalino. Mas, conforme já exposto, não se pode confundir estes institutos, já
que, em suma:
O indulto de Natal é concedido pelo presidente da
República e a saída temporária, pelo juiz da vara das execuções;
O indulto de Natal é coletivo, enquanto que a saída
temporária é concedida de forma individual;
O indulto de Natal extingue a pena, já que se trata
de verdadeiro perdão. A saída temporária, se cumprida fielmente, em nada afeta
a pena; se descumprida, pode, eventualmente, fazer com que o condenado regrida
de regime.
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* Eudes Quintino de Oliveira
Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, com
doutorado e pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp -
Centro Universitário do Norte Paulista.