Crimes de sonegação fiscal
e contra a ordem tributária
https://jus.com.br/imprimir/33414/crimes-de-sonegacao-fiscal-e-contra-a-ordem-tributaria
Publicado em 11/2014. Elaborado
em 10/2014.
Demonstrar
a aplicação da lei penal no que tange as condutas típicas da sonegação fiscal e
dos crimes contra ordem tributária e definir qual as sanções aplicáveis.
·
CRIMES DE SONEGAÇÃO FISCAL E CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA
Os Crimes
de sonegação fiscal estão previstos na Lei 4.729/1965, embora a doutrina
majoritária entenda que essa Lei fora revogada tacitamente pela Lei 8.137/1990
que trata dos crimes contra a ordem tributária.
Hugo de
Brito Machado, ensina que a Lei 4.729/1965 trouxe a definição de crime de
sonegação fiscal como comportamentos descritos de forma casuística, estando
relacionado com o dever tributário. Sendo que essa lei fora criada com o desejo
das autoridades que pretendiam utilizar dessa norma legal com a intenção de
intimidar os contribuintes que sonegavam os impostos. (Curso de Direito
Tributário Brasileiro. 28ª Ed. 2007. Pg. 500).
Ainda de
acordo com o mencionado autor, na realidade com a criação da Lei 4.729/65 as
pessoas que sonegavam tributos ao invés de serem punidos de maneira mais grave,
obtiveram na realidade favorecimento pela aplicação do princípio da
especialidade. Tendo em vista que as infrações realizadas e que estavam
tipificadas na mencionada Lei, poderiam ser capituladas no artigo 171, o qual
define o crime de estelionato, ou nos artigos 297, 298, ou 299, todos do Código
Penal, os quais definem os crimes de falsidade material ou ideológica de
documentos. (Curso de Direito Tributário Brasileiro. 28ª Ed. 2007. Pg.
500-501).
Também entende
que houve a revogação da Lei 4.729/65 o tributarista Luciano Amaro, quando
afirma:
“A Lei n.
8.137/90, ao definir os crimes contra a ordem tributária, reescreveu a lista
dos crimes antes designados de “sonegação tributária”, pela Lei 4.729/65.” (Direito
Tributário Brasileiro. Pg. 465).
O
doutrinador criminalista Ricardo Antônio Andreucci, comentando os crimes contra
a ordem tributária, também se posiciona pela derrogação da Lei 4.729/65 com a
entrada em vigor da Lei 8.137/90, embora o mencionado autor entenda que não é
consenso esse posicionamento na doutrina brasileira.
Nesse
sentido afirma o renomado doutrinador:
É que a
Lei n. 8.137/90, além de preservar as figuras típicas contidas na legislação
anterior, criou outras novas, dando redação mais técnica aos dispositivos e
eliminando disposições inúteis. (Legislação Penal Especial. Pg. 351).
CRIMES
CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
Superada
a discussão sobre a revogação da Lei 4.729/1965 pela Lei 8.137/1990, entra-se
na análise dos artigos 1º e 2º da Lei 8.137/1990, que trata dos Crimes contra a
Ordem Tributária.
Assim,
dispõe o artigo 1º:
Art. 1º-
Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou
contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
·
omitir informação, ou prestar declaração falsa às
autoridades fazendárias;
·
fraudar a fiscalização tributária, inserindo
elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou
livro exigido pela lei fiscal;
·
falsificar ou alterar nota fiscal, fatura,
duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação
tributável;
·
elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar
documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;
·
negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota
fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de
serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em descordo com a legislação.
·
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e
multa.
(....)
Já o
artigo 2º da mesma Lei, dispõe:
Art. 2º.
Constitui crime da mesma natureza:
·
fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre
rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou
parcialmente, de pagamento de tributo;
·
deixar de recolher, no prazo legal, valor de
tributo ou contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito
passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
·
exigir, pagar ou receber, para si ou para o
contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou
deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;
·
deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o
estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgãos ou
entidade de desenvolvimento;
·
utilizar ou divulgar programas de processamento de
dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação
contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.
·
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos,
e multa.
Conforme
se percebe o artigo 1º em seu “caput”, determina que a supressão ou redução do
tributo constitui crime de sonegação fiscal e contra a ordem tributária. O
verbo suprimir indica que o agente ativo do crime em epígrafe agiu com dolo
específico no sentido de não pagar qualquer valor referente aos tributos
devidos ao ente público. Já a redução dos tributos refere-se à diminuição no
pagamento de algum tributo devido, dessa forma, a ilicitude do ato estará
relacionado ao valor pago que será menor do que aquele realmente devido pelo
contribuinte.
Além dos
verbos acima citados, os incisos dos artigos 1º e 2º, trazem um rol extenso de
verbos que indicam o crime de sonegação fiscal e contra a ordem tributária,
quais sejam:
a)
omissão de informações ou prestação de declaração falsa às autoridades
fazendárias;
b) fraude
à fiscalização tributária;
c)
falsificação ou alteração de documento relativo a operação tributável;
d)
elaboração, distribuição, fornecimento, emissão ou utilização de documento
falso ou inexato;
e)
negativa ou ausência de fornecimento de nota fiscal ou fornecimento em
desacordo com a legislação;
f)
declaração falsa ou omissão de declaração;
g)
exigência, pagamento ou recebimento de percentagem sobre a parcela de imposto
ou contribuição;
h) omissão
ou aplicação indevida de incentivo fiscal ou parcelas de imposto;
i)
utilização ou divulgação indevida de programa de processamento de dados.
CONCEITO
DE SONEGAÇÃO FISCAL
Alexandre
de Moraes e Gianpaolo Poggio Smanio fazem a seguinte definição de sonegação
fiscal:
“Sonegação
fiscal é a ocultação dolosa, mediante fraude, astúcia ou habilidade, do
reconhecimento de tributo devido ao Poder Público”. (Antônio Ricardo Andreucci.
Legislação Penal Especial. Pg. 353).
Além de
definirem o que seja sonegação fiscal os supracitados doutrinadores informam
que a lei não fez a conceituação explicita de sonegação fiscal, porém adotou
como critério para conceituar o delito em comento os delitos contra a ordem
tributária, a supressão ou redução de tributos ou contribuição social ou
acessório, e depois enumerando, taxativamente, quais as modalidades de conduta
que podem levar a tal supressão ou redução, constituindo genericamente o que
seja sonegação fiscal. (Antônio Ricardo Andreucci. Legislação Penal Especial.
Pg. 353).
Sujeito
Ativo
É sujeito
ativo do crime de sonegação fiscal definidos nos artigos 1º e 2º da Lei
8.137/90, o contribuinte que tem sua conduta amoldada a qualquer das hipóteses
legais.
Concurso
de Pessoas
O
concurso de pessoas nos crimes de sonegação fiscal tem previsão no artigo 11 da
Lei 8.137/90, que admite a co-autoria e a participação nesse crime.
Assim
dispõe o mencionado artigo:
Art. 11. Quem de
qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes
definidos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua
culpabilidade.
Rui
Stoco, afirma que:
“o
empregado que colabora com o patrão na sonegação de impostos ou contribuições
não pode alegar que recebeu ordens para tanto, pois tal ordem, à evidência,
terá sido ilegal, não obrigando quem quer que seja.” (Antônio Ricardo
Andreucci. Legislação Penal Especial. Pg. 352).
A
coautoria é definida como a colaboração recíproca que visa o mesmo fim, ou
seja, ocorre co-autoria quando dois agentes realizam o verbo do tipo conjuntamente.
Já a
participação ocorre toda vez que o partícipe concorre para que o autor ou
coautor consiga realizar a conduta desejada. Sendo assim, partícipe é aquele
que mesmo não realizando o núcleo do verbo concorre de alguma forma para que se
realize o crime almejado.
E
conforme mencionado nos crimes de sonegação fiscal e contra a ordem tributária,
poderá ocorrer tanto participação como co-autoria, devendo os co-autor e o
partícipe responder pelo mesmo crime.
Sujeito
Passivo
O sujeito
passivo do crime em comento é o ente público competente para instituir e cobrar
o tributo, podendo ser o Município, o Estado e a União Federal.
Objetividade
Jurídica
Proteger
o erário público, a fé pública e a Administração Pública, haja vista que se
busca priorizar os interesses públicos em detrimento do interesse do
particular.
Objeto
Material
O objeto
material do crime em epígrafe está representado pela redução ou supressão dos
tributos devidos ao ente público competente.
Condutas
Vêm
previstas nos artigo 1º e 2º da Lei 8.137/90 e são divididas em condutas
omissivas e comissivas.
Elemento
Subjetivo
Conforme
os ensinamentos de Ricardo Antônio Andreucci, o elemento subjetivo dos crimes
de sonegação fiscal consiste na vontade livre e consciente de praticar as
condutas típicas. (Legislação Penal Especial. Pg. 352).
Sendo
assim, o sujeito ativo deve ter dolo específico, cuja intenção seja a de
suprimir ou reduzir o pagamento dos tributos devidos ao ente tributante. Porém,
por se tratar de crime material, ou seja, que depende do resultado, caso o
sujeito ativo não consiga efetivar a sonegação, não poderá ter sua conduta
tipificada nos artigos 1º e 2º da 8.137/1990, porém deverá responder por
condutas típicas que estão previstas no Código Penal Brasileiro.
Nesse
sentido já se pronunciou o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
conforme se percebe no julgado retrotranscrito:
“O crime
de sonegação fiscal apenas se consuma quando presente o dolo específico em
fraudar o fisco”. (TJSP. Apelação nº 245.615-3. Julg. 29 de março de 2000).
Dessa,
forma não poderá ser o suposto infrator punido com as penas da Lei 8.137/1990
nas hipóteses em que não consiga realizar os núcleos dos verbos indicativos do
crime, podem, porém responder pelos crimes de falsidade documental que estão
previstos nos artigos 296 a 305 do Código Penal Brasileiro.
Consumação
Como já
mencionado por se tratar de crime material este somente se consuma com a
redução no pagamento do tributo ou com a supressão do mesmo.
Tentativa
Desde que
haja o fracionamento do “iter criminis” no crime comissivo é admitida a
tentativa, porém com relação aos crimes omissivos e nos crimes instantâneos a
tentativa não é admitida.
Competência
e Ação Penal
A justiça
comum é competente para processar e julgar os crimes contra a ordem tributária,
conforme estabelece a Lei 8.137/1990. No entanto, nos casos em que a União
tiver interesse a competência será da Justiça Federal.
RESPONSABILIDADE
ADMINISTRATIVA, CIVIL E PENAL
O sujeito
ativo dos crimes de sonegação fiscal e contra a ordem tributária poderá,
responder na esfera cível, administrativa e penal, haja vista que essas
responsabilidades são autônomas.
Entretanto,
nos crimes em estudo ocorre uma independência relativa, haja vista que poderá ocorrer
repercussão de uma instância sobre outra.
Neste
sentido é o ensinamento de Rui Stocco:
“Ora a
decisão no juízo civil, com trânsito em julgado, ou o acolhimento de recurso
administrativo pelo Fisco, entendendo não ter havido supressão ou redução de tributo,
descaracteriza a ação ou omissão do contribuinte como crime”. (Antônio Ricardo
Andreucci. Legislação Penal Especial. Pg. 355).
Exatamente
por ser uma autonomia relativa no que diz respeito à responsabilidade
administrativa e civil é que há o entendimento que o contribuinte acusado de
ter praticado crime contra a ordem tributária não poderá ser processado antes
da decisão condenatória definitiva na área administrativa.
Inclusive
este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, como pode ser observado nos
julgados abaixo transcritos:
“PENAL.
PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. LEI 8.137/90. ART. 1º.
LANÇAMENTO FISCAL. I – Falta justa causa para a ação penal pela prática do
crime tipificado no art. 1º da Lei 8.137/90, enquanto não constituído, em
definitivo, o crédito fiscal pelo lançamento. É dizer a consumação do crime
tipificado no art 1ª da Lei 8.137/90 somente se verifica com a constituição do
crédito fiscal, começando a correr a partir daí, a prescrição. HC 81.611/DF,
Ministro Sepúlveda Pertence, Plenário, 10.12.2003. II. – HC deferido” (STF – 2ª
T. – HC 85.051/MG – Rel. Min. Carlos Velloso – Julg. 07 de junho de 2005. DJ de
1 de julho de 2005).
“PERSECUÇÃO
CRIMINAL – CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL – PROCESSO ADMINISTRATIVO EM CURSO – SUSPENSÃO
DA EXIGIBILIDADE DO TRIBUTO – VERBETE N. 609 DA SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL – INADEQUAÇÃO. De acordo com o Verbete n. 609 da Súmula do Supremo
Tribunal Federal, é incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal,
longe ficando de autorizar a persecução, quando suspensa, pelo processo
administrativo fiscal, a exigibilidade do tributo” (STF – 1ª T. – HC 84.942/SP
– Rel. Min. Marco Aurélio – Julg. 08 de março de 2005 – DJ de 15 de abril de
2005).
Outro
problema que alcança a responsabilidade penal nos crimes contra a ordem
tributária ocorre em relação à suposta responsabilidade penal da pessoa
jurídica.
Hugo de
Brito Machado faz críticas sobre a possibilidade da pessoa jurídica ser
responsabilizada penalmente pela prática de crimes contra a ordem tributária,
para o mencionado tributarista o que deve ocorrer em casos como este é a
responsabilização penal daqueles que administram a pessoa jurídica. (Curso de
Direito Tributário. Pg. 509).
Além
disso, existe o inconveniente em querer que a ação penal seja recebida, mesmo
sem a descrição da conduta realizada pelo suposto infrator, o que se constata
como violação ao direito do contraditório e ampla defesa, sendo que o acusado
será responsabilizado de forma objetiva, ou seja, sem prova da culpa ou dolo
praticado.
Nesse
sentido é o ensinamento de Hugo de Brito Machado “ipsis litteris”, senão
vejamos:
“Muitos
alegam, sem razão, que a ação penal, nos crimes contra a ordem tributária, deve
ser recebida ainda quando não descreva a conduta individual de cada denunciado.
Seria bastante a descrição do fato capaz de tipificar o crime, ocorrido no
âmbito da empresa da qual o denunciado é dirigente. Admitir-se tal argumento é
admitir não apenas a responsabilidade objetiva, mas, também, a responsabilidade
pelo fato de outrem”. (Curso de Direito Tributário. Pg. 509).
Sendo
assim, para que não haja injustiça e para ser assegurado o direito ao
contraditório e a ampla defesa, necessário que ocorra a descrição das condutas
de cada suposto infrator para que lhes sejam dados o direito de se defender.
EXTINÇÃO
DA PUNIBILIDADE
Ocorre a
extinção da punibilidade nos crimes de sonegação fiscal e contra a ordem
tributária quando há o pagamento do tributo antes de ser realizada a denúncia,
consoante o disposto no artigo 34 da Lei 9.249/1995.
Art. 34 –
Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei 8.137, de 27 de dezembro
de 1990, e na Lei n. 4.729, de julho de 1965, quando o agente promover o
pagamento do tributo ou contribuição social. Inclusive acessório, antes do
recebimento da denúncia”.
Porém,
conforme os ensinamentos de Ricardo Antônio Andreucci, o Supremo Tribunal
Federal vem entendendo após o advento da Lei 10.684/2003, que em seu artigo 9º
permite que se opere a extinção da punibilidade, mesmo que o pagamento do
tributo ou contribuição social seja feito após o recebimento da denúncia, em
qualquer fase do processo. (Legislação Penal Especial. Pg. 358).
O artigo
156 do Código Tributário Nacional dispõe, sobre a extinção do crédito
tributário da seguinte forma:
Art. 156.
Extinguem o crédito tributário:
·
o pagamento;
·
a compensação;
·
a transação;
·
a remissão;
·
a prescrição e decadência;
·
a conversão do depósito em renda;
·
o pagamento antecipado e a homologação nos termos
do disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º;
·
a consignação em pagamento nos termos do disposto
no § 2º do art. 164;
·
a decisão administrativa irreformável, assim
entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto
de ação anulatória;
·
a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e
condições estabelecidas em lei.
·
Embora a extinção do crédito tributário ocorra na
maioria das vezes após o pagamento do débito por parte do contribuinte, essa
extinção poderá ocorrer por qualquer das hipóteses mencionados no artigo 156 do
Código Tributário Nacional, e uma vez, sendo extinto o débito também será
extinta a punibilidade pela suposta prática do crime tipificado na Lei
8.137/90.
Neste
sentido entendeu o Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 81.929/ RJ, 1ª
turma, Rel. Min, Cézar Peluso, j. 16 de dezembro 2003:
“Ação
Penal. Crime Tributário. Tributo. Pagamento após o recebimento da denúncia.
Extinção da punibilidade. Decretação. HC concedido de ofício para tal efeito.
Aplicação retroativa do artigo 9º da Lei Federal nº 10.684/03 c/c artigo 5º,
XL, da CF, e artigo 61 do CPP. O pagamento do tributo a qualquer tempo, ainda
que após o recebimento da denúncia extinga a punibilidade do crime tributário”.
Na
realidade, conforme já mencionado, a extinção da punibilidade nos crimes contra
a ordem tributária se torna decorrência lógica das causas de extinção do
crédito tributário. Dessa forma, se ocorrer qualquer das hipóteses do artigo
156 do Código de Tributário Nacional que regulamenta a extinção do crédito
tributário, conseqüentemente ocorrerá a extinção da punibilidade penal do
suposto infrator.
PARCELAMENTO
DO DÉBITO ACARRETA A EXTINÇÃO E/OU A SUSPENÇÃO DA PUNIBILIDADE
O artigo
151 do Código Tributário Nacional estabelece as hipóteses da suspensão do
crédito tributário, dentre elas em seu inciso VI, se verifica o parcelamento do
débito.
O
parcelamento na realidade trata-se de novação, instituto do direito civil que
constitui uma das formas de pagamento indireto onde se extingue uma dívida
anterior e se forma outra que a substitui. O referido instituto jurídico tem
previsão nos artigos 360 a 367 do Código Civil Brasileiro.
Não
obstante, nos crimes contra a ordem tributária o contribuinte poderá realizar o
parcelamento do seu débito o que acarretará a extinção de sua punibilidade.
Entretanto, há um debate jurisprudencial sobre em qual momento ocorre a
referida extinção da punibilidade. (Legislação Penal Especial. Pg. 359-360).
Neste
sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é que o parcelamento
deverá ser realizado antes da denúncia e que uma vez ocorrendo o parcelamento
deverá ser extinta a punibilidade, independentemente de o sujeito ativo do
crime contra a ordem tributária se torne inadimplente nas futuras parcelas.
Nesta
senda são os julgados abaixo transcritos:
“PENAL E
PROCESSUAL. SONEGAÇÃO FISCAL. PARCELAMENTO ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
PUNIBILIDADE. EXTINÇÃO. Uma vez deferido o parcelamento em momento anterior ao recebimento
da denúncia, verifica-se a extinção da punibilidade, prevista no artigo 34 da
Lei n. 9.249/95, sendo desnecessário, para tanto, o pagamento integral do
débito. Precedente da Terceira Seção do STJ. Ordem concedida, para declarar
extinta a punibilidade e determinar o trancamento da ação penal” (STJ – 6ª T –
HC 33.416/SP – Rel. Min. Paulo Medina – Julg. 27abril de 2004).
“RECURSO
ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL. PARCELAMENTO DO DÉBITO
ANTES DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
1. É
firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, em se
tratando de crime contra a ordem tributária, o parcelamento do débito, antes do
recebimento da denúncia, extingue a sua punibilidade (Intelecção do artigo 34
da Lei 9.249/95)
2.
Recurso conhecido e provido” (STJ – 6ª T – REsp 430.816/SC – Rel. Min. Hamilton
Carvalhido – Julg. 25 de junho de 2002).
Já o
Supremo Tribunal Federal, entende que para haver a extinção da punibilidade nos
crimes de sonegação fiscal é necessário haver o pagamento integral de todas as
parcelas, e que neste caso não ocorrerá a extinção da punibilidade, mas apenas
a sua suspensão, bem como a suspensão da prescrição até o efetivo pagamento do
débito tributário. (Legislação Penal Especial. Pg. 361).
Pode-se
constatar tal entendimento pala análise do julgado abaixo:
“SONEGAÇÃO
FISCAL E FALSIFICAÇÃO DE SINAIS PÚBLICOS E VALE POSTAL. PRELIMINAR.
PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. SUSPENSÃO DA
AÇÃO PENAL. Comprovado nos autos o parcelamento e o regular pagamento do débito
tributário junto à Fazenda estadual, é impositiva a suspensão da ação penal.
Ordem concedida de ofício, para suspender a ação penal enquanto houver o
parcelamento do débito tributário devido à Fazenda estadual. Inteligência do
art. 9º ‘caput’, da Lei 10.864/2003, c/c Lei Complementar 104/2001, que alterou
o art. 151 do Código Tributário Nacional” (STF – 2ª T – HC 83.936/TO – Rel.
Min. Joaquim Barbosa – Julg. 31 de agosto de 2004 – DJ de 25 de fevereiro de
2005).
No ano de
2011, entrou em vigor a Lei 12.382, que em seu artigo 6º altera o artigo 83 da
Lei 9.430/1996 e dispõe sobre o parcelamento do crédito tributário.
A Lei
12.382/2011 em seu artigo 6º, § 2º, estabelece exatamente que a pretensão
punitiva do Estado deve ser suspensa enquanto houver o parcelamento do débito
tributário, não podendo neste lapso temporal ocorrer a denúncia criminal contra
o sujeito ativo dos crimes contra a ordem tributária.
Ademais,
estabelece o § 3º, do supracitado artigo que no período do parcelamento a
prescrição criminal não corre durante o período da suspensão punitiva,
ratificando assim o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
IMPOSSIBILIDADE
DE PAGAR O TRIBUTO
Existe o
entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de não ser aplicada
penalidade ao contribuinte pessoa física que se encontre em situação de
insolvência e não pode assim realizar o pagamento do crédito tributário.
(Legislação Penal Especial. Pg. 365).
O mesmo
entendimento abrange a pessoa jurídica que esteja em situação de dificuldade
financeira.
Hugo de
Brito Machado, entende que em casos como este ocorre uma causa excludente da
culpabilidade, qual seja, inexigibilidade de conduta diversa, assim ensina o
referido doutrinador.
“A nosso
ver, a não exigibilidade de outra conduta configura-se sempre que, em situação
de crise financeira, a opção pelo uso do dinheiro disponível para o pagamento
de empregados e dívidas outras seja a única forma de manter a empresa em
funcionamento, numa tentativa sincera de superação da crise, depois da qual a
dívida tributária será paga”. (Curso de Direito Tributário Brasileiro. Pg.
508).
E
continua o mencionado autor:
“Não se
venha argumentar com o interesse público na arrecadação do tributo, que
afastaria a legitimidade da opção por outros pagamentos. Em relação aos
salários, a propria lei estabelece expressamente a preferência destes em
relação aos tributos (CTN, art. 186). E o pagamento de outras dívidas, quando
indispensável para que a empresa continue funcionando, a legitimidade é fora de
dúvida, em face do interesse dos empregados na manutenção do emprego, e do
próprio fisco, na manutenção da fonte dos tributos”.
A
DELAÇÃO PREMIADA NOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
O
instituto da delação premiada está presente no ordenamento jurídico brasileiro
no Código Penal e em algumas leis esparsas. O referido instituto pode ser
percebido no artigo 159, § 4º do Código Penal Brasileiro, que assim dispõe:
Art. 159.
Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem,
como condição ou preço do resgate:
Pena –
reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
(....)
§ 4º Se o
crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar, facilitando a
libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).
Pela
análise do artigo supracitado, percebe-se que o instituto da delação premiada
tem por objetivo, reduzir a pena da pessoa que age em concurso com outras para
realizar um crime e que posteriormente aja no sentido de contribuir para que
atividade ilícita seja finalizada. No caso específico do artigo 159, § 4º do
Código Penal, sua ação deve contribuir para libertação do seqüestrado. Dessa
forma, não obterá a redução da pena aquele que faz a denúncia, mas que não
obtém êxito na libertação do seqüestrado.
Nos
crimes contra a ordem tributária, também existe o instituto da delação
premiada, o referido instituto foi instituído pala Lei nº 9.080/1995.
Sendo
assim, a delação premiada é garantida ao co-autor ou partícipe, que realiza a
confissão espontânea e revela à autoridade policial ou judicial o crime
praticado. Porém, diversamente do que ocorre nos casos regidos pelo Código
Penal e por outras Leis especiais, no caso da delação premiada nos crimes
contra a ordem tributária, não é pressuposto para redução da pena o resultado
que impeça os efeitos do crime praticado.
Dessa
forma, a simples denúncia do crime por parte de um coautor ou partícipe já
serve como fundamento para ser reduzida sua pena.
·
CONCLUSÃO
Diante de
todo o exposto chega-se à conclusão de que apesar de nossa legislação
estabelecer sanções penais àqueles que cometem crimes de sonegação fiscal e
contra a ordem tributária.
Verifica-se
na realidade que estas sanções penais muito raramente são aplicadas, tendo em
vista que existem diversas possibilidades do infrator não ser punido
penalmente, como por exemplo, nas hipóteses em que o sonegador efetua o
pagamento dos tributos sonegados, até mesmo após o recebimento da denúncia.
BIBLIOGRAFIA
AMARO, Luciano.
Direito Tributário Brasileiro, 11ª edição. – São Paulo. Editora Saraiva, 2005.
ANDREUCCI,
Antônio Ricardo. Legislação Penal Especial, 7ª edição – São Paulo. Editora
Saraiva, 2010.
MACHADO,
Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28ª edição. – Fortaleza. Editora
Malheiros, 2007.
Autor
·
