Curso: Direito
Disciplina: Direito Processual Civil III
Professora: Ana Ketsia B. M. Pinheiro
Título da aula: Teoria Geral do Processo Cautelar
Conteúdo: Aspectos formais. Características. Classificação. Poder geral
de cautela do juiz. Requisitos específicos. Relação jurídica processual.
Competência. Extinção e perda da eficácia. Procedimento.
Metodologia: aula expositiva.
Aula
2
ATENÇÃO!!!
Vejamos o que dispõe o art. 520 CPC:
Art.
520. A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo. Será, no
entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que:
I - homologar a divisão ou a
demarcação;
II - condenar à prestação de
alimentos;
V - rejeitar liminarmente embargos à execução
ou julgá-los improcedentes;
Diante do exposto, surge um questionamento: e se houver
julgamento conjunto (cautelar + ação principal julgadas numa única sentença), sendo
o requerente o vencedor, a apelação interposta pelo requerido deve ou não ser
recebida no efeito suspensivo?
R. Quando houver julgamento conjunto e o requerido vencido
resolver apelar, a parte da sentença que verse sobre a cautelar será recebida
apenas no efeito devolutivo, ao passo que a parte que verse sobre a ação
principal será recebida nos dois efeitos: devolutivo e suspensivo.
Passemos à análise do art. 458 do CPC:
Art. 458. São requisitos essenciais da
sentença:
I - o relatório, que conterá os nomes
das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das
principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II - os fundamentos, em que o juiz
analisará as questões de fato e de direito;
III - o dispositivo, em que o juiz
resolverá as questões, que as partes Ihe submeterem.
Pergunta-se: diante do fato da concessão da medida cautelar
estar amparada em juízo de probabilidade, é correto afirmar que, na sentença
proferida em sede de processo cautelar a fundamentação é dispensável?
R. Não. Às sentenças proferidas em processo cautelar se
aplicam as disposições do art. 458 do CPC, sendo que a exigência de motivação
das decisões judiciais é constitucional.
Art. 806. Cabe à parte propor a ação,
no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da efetivação da medida
cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório.
Art. 807. As medidas cautelares
conservam a sua eficácia no prazo do artigo antecedente e na pendência do
processo principal; mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas.
Os artigos acima citados nos trazem duas informações distintas. Pelo art. 806, após o cumprimento da medida
cautelar, o requerente dispõe de 30 dias para ajuizar a ação principal, ao
passo que o art. 807 diz que, uma vez concedida a medida cautelar, a mesma deve
ser efetivamente cumprida no prazo de 30 dias, sob pena de perda de sua
eficácia.
Art. 810.
O indeferimento da medida não obsta a que a parte intente a ação, nem influi no
julgamento desta, salvo se o juiz, no procedimento cautelar, acolher a alegação
de decadência ou de prescrição do direito do autor.
Normalmente,
o julgamento da cautelar não faz coisa julgada material. Todavia, nas hipóteses
de reconhecimento judicial de prescrição e decadência, haverá coisa julgada
material. O ajuizamento da ação principal fica impedido.
Tomando
por base o disposto no art. 810, se alguém pleitea a concessão de uma medida
cautelar, mas esta lhe é negada pelo juiz, é possível que este requerente
ajuíze uma nova ação pleiteando novamente a mesma medida, visto que não há
coisa julgada material?
R.
Apesar do fato de que a decisão proferida em sede de cautelar não faz coisa
julgada material, é vedada a repropositura da ação, baseada no princípio do non bis in idem. Assim a parte só pode
pleitear novamente a cautelar caso haja um fundamento novo.
As
medidas cautelares são norteadas pelo princípio da fungibilidade, segundo o
qual o magistrado pode conceder a medida cautelar que lhe pareça mais adequada
ao caso concreto, ainda que a mesma não tenha sido requerida pelo autor.
Todavia, será que é possível haver fungibilidade entre
cautelares nominadas e inominadas?
R.
Embora algumas cautelares exijam procedimentos específicos (que vão além do fumus boni juris e do periculum in mora) é possível haver esta
modalidade de fungibilidade, desde que o requerente não tente se valer desta
prerrogativa como modo de burlar os requisitos específicos da cautela
pretendida.
Atenção
ao disposto no§ 7º do art. 273 do CPC:
§ 7o Se o autor, a
título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar,
poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida
cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. (Incluído
pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)
A
inteligência deste parágrafo nos leva a concluir que também haverá
fungibilidade entre a tutela cautelar e a tutela antecipatória, com a ressalva
da necessidade do preenchimento dos requisitos específicos de cada modalidade
de tutela.
Já
vimos que o prazo para o réu contestar é de 5 dias, contados da juntada do
mandado de intimação aos autos. Todavia,
neste prazo, além de contestar, o réu também pode opor exceção de incompetência
(uma vez que a incompetência relativa só pode ser decretada pelo juiz mediante
requerimento da parte). O que acontece
com o processo cautelar acaso o réu não oponha exceção de incompetência, com a
conseqüente prorrogação de competência?
R.
Neste caso, restará prorrogada a competência do juízo, não apenas para o
trâmite da cautelar, como também para o tramite da ação principal.
OBS.: Se a Fazenda Pública estiver no
pólo passivo da ação cautelar, o prazo para contestar se conta em quádruplo
(CPC, art. 188); caso haja mais de um réu, com diferentes procuradores, o prazo
será contado em dobro (CPC, art. 191).
OBS2.: Quando a cautelar tiver sido
proposta contra o Poder Público, a sentença ficará sujeita ao reexame
obrigatório (art. 475 CPC)
1. Diferenciação
entre medida cautelar e processo cautelar
Segundo
Vicente Greco Filho, medida cautelar é a “providência
jurisdicional protetiva de um bem envolvido no processo”, enquanto que o
processo cautelar é a “relação jurídica
processual, dotada de procedimento próprio, que se instaura para a concessão de
medidas cautelares”.
2. Responsabilidade
Objetiva nas Cautelares
O autor da ação cautelar, à base de uma sumária e superficial
demonstração de seu possível direito, quase sempre impõe restrições mais ou
menos graves a direitos do promovido.
O
Estado defere essas restrições no pressuposto de que o bom resultado do
processo principal, que aparentemente deve ser favorável ao requerente, esteja
de fato dependendo das medidas de prevenção.
Como na tutela preventiva não há nada de certo e
definitivo em torno daquilo em que se apóia, a lei faz com que o requerente da
medida cautelar assuma todo o risco gerado por sua execução.
Art. 811. Sem prejuízo do disposto no
art. 16, o requerente do procedimento cautelar responde ao requerido pelo
prejuízo que Ihe causar a execução da medida:
I - se a sentença no processo
principal Ihe for desfavorável;
II - se, obtida liminarmente a medida
no caso do art. 804 deste Código, não promover a citação do requerido dentro em
5 (cinco) dias;
III - se ocorrer a cessação da
eficácia da medida, em qualquer dos casos previstos no art. 808, deste Código;
IV - se o juiz acolher, no
procedimento cautelar, a alegação de decadência ou de prescrição do direito do
autor (art. 810).
Parágrafo único. A indenização será
liquidada nos autos do procedimento cautelar.
Maria Helena Diniz,
em seu Código Civil comentado explica que a responsabilidade civil objetiva “impõe o ressarcimento
de prejuízo, independentemente de culpa, nos casos previstos legalmente, ou
quando a atividade do lesante importar, por sua natureza, potencial risco para
direito de outrem”
Como visto o CPC, em seu art. 811, determina que o
requerente responda pelos prejuízos causados ao requerido. Acabou, entretanto, relacionando
as hipóteses de responsabilidade objetiva, procurando regulamentar a matéria,
esclarecendo em quais hipóteses o requerente vai responder objetivamente.
Essa lista do Código é taxativa, visto que a
responsabilidade objetiva é uma exceção dentro do sistema jurídico, possuindo
uma interpretação restritiva.
O requerente responde objetivamente quando:
·
julgar desfavorável a ação principal: o Código adota uma responsabilidade rígida do
requerente. Desconsidera-se a autonomia das cautelares, não importando sua
procedência;
·
não propuser a
ação principal no prazo de 30 dias:
neste caso, o requerente estará sendo punido pela tentativa de eternizar a
cautelar;
·
deixar de citar
o requerido em 5 dias: deve-se fazer
uma interpretação sistemática. Não se pode esquecer das excludentes de
responsabilidade, ou seja, o requerente não vai responder pelo dano nos casos
em que a não-citação ocorreu em razão da omissão do Estado ou de um de seus
agentes;
·
deixar de
executar a medida no prazo de 30 dias:
neste caso, podem acontecer duas situações diferentes: decorridos os 30 dias,
há a prática de uma medida abusiva ou o Código de Processo Civil prevê que a
medida cautelar pode causar danos mesmo que não tenha sido executada. Pelo
simples fato de ser concedida a cautelar, poderá causar um dano, sendo ela
executada ou não;
·
o processo
principal for extinto com ou sem julgamento do mérito: houve uma repetição, visto que, na primeira
hipótese, já há disposição sobre isso;
·
na cautelar
reconhecer decadência ou prescrição:
prevê a hipótese de, pelo fato de a cautelar já não dar o direito da principal,
o requerente responder pelo dano.
Na hipótese do requerente obter uma liminar e perder a
cautelar, não há responsabilidade objetiva, visto que o Código vincula essa
responsabilidade à perda do processo principal. A perda da cautelar leva a uma
responsabilidade subjetiva.
A responsabilidade civil em caso de medida cautelar
não executada em 30 dias, na realidade, só poderá ocorrer quando, já
ultrapassado o aludido prazo, vier a providência preventiva a ser tardiamente
executada. Isto porque, atingido o prazo em questão, a medida inexecutada
perde, automaticamente, sua eficácia. Se
ocorrer, mesmo assim, sua execução, o caso será, sem dúvida, de ato ilegítimo.
Claro, contudo, que sem o ato executório não se pode cogitar, em hipótese
alguma, da responsabilidade civil em questão, já que o texto do caput do art. 811 fala em
responsabilidade do requerente perante o requerido, “pelo prejuízo que lhe
causar a execução da medida”.
2.1. Funcionamento da responsabilidade objetiva
O Código de
Processo Civil determina que a liquidação da responsabilidade objetiva seja
feita nos próprios autos da cautelar, ou seja, não se faz necessária a
propositura de ação de indenização contra o requerente para o requerido obter o
reconhecimento de seu direito e a condenação do responsável. O requerido terá
que comprovar o dano e o nexo causal. No caso, haverá liquidação de sentença, nos
termos do parágrafo único do art. 811, segundo o qual
“a indenização será liquidada nos autos
do procedimento cautelar.
RESUMINDO: Em nenhuma circunstância se exigirá prova de culpa ou
dolo do promovente da ação cautelar. A
responsabilidade civil, na espécie, é puramente objetiva, de sorte que seus
fundamentos são apenas a lesão do requerido, a frustração da medida cautelar
nos termos do art. 811 e o nexo causal entre a medida e o dano.
As normas a seguir estudadas se destinam ao procedimentos
cautelares específicos, que possuem algumas peculiariaridades próprias e que,
em algum momento acabam se afastando das regras do procedimento cautelar
comum. Todavia, cumpre ressaltar que as
normas do procedimento comum cautelar serão aplicadas subsidiariamente aos
procedimentos específicos.
3. Procedimento
nas cautelares nominadas
3.1. ARRESTO
Para que se tenha uma boa compreensão desse instituto,
faz-se importante uma visão geral da obrigação de pagar, que é liquidada pela
chamada execução por quantia certa. Ingressa-se com a ação, faz-se a citação e
posteriormente a penhora. Como regra geral, o momento em que os bens sofrem
constrição para garantir o pagamento é a penhora. Do risco de o devedor não
possuir bens para penhorar, quando chegar esta fase, surge o arresto.
Greco Filho assevera que “arresto é a apreensão cautelar de bens, com a finalidade de garantir
uma futura execução por quantia”. Assim, sendo, podemos dizer que este
instituto visa garantir a efetividade de uma futura execução, impedindo que o
devedor desapareça, se esconda ou esconda seus bens.
O arresto é, portanto, uma medida cautelar que tem por
objetivo a constrição de bens do devedor, de modo a garantir a satisfação de um
crédito. Essa medida cautelar poderá ser tanto preparatória quanto incidental.
Para preservar o crédito, o credor poderá valer-se do arresto, seja antes ou
depois do ingresso da execução.
Não se pode confundir essa figura do arresto com o
arresto executivo. O Código prevê que se o executado não for encontrado para
citação, seus bens serão arrestados. No caso, os bens serão arrestados
tão-somente pelo fato de que o executado não foi citado, não havendo risco de
dilapidação do patrimônio.
O arresto cautelar pressupõe risco e o arresto de
execução é medida de coerção para que o executado venha ao processo.
3.1.1.
Condições ou Requisitos Específicos da Admissibilidade do Arresto
O arresto está sujeito às condições da ação;
entretanto, é importante identificar esses elementos dentro de um arresto:
·
Possibilidade jurídica do pedido: somente serão arrestáveis bens penhoráveis; o
arresto deverá ocorrer nos limites do crédito, podendo ser acrescido, ao valor
da dívida, os juros e as despesas processuais.
O arresto incide sobre bens previamente indeterminados;
·
Legitimidade de agir: no tocante à legitimidade ordinária, a regra geral é
que somente poderá pleitear o arresto o credor em face do devedor; é a situação
de normalidade. Se for uma cautelar preparatória, o requerente se confunde com
a figura do autor da ação principal. Nos casos de cautelar incidental, no
entanto, essa situação poderá não ocorrer, ou seja, o réu do processo principal
pode ser o requerente da cautelar de arresto (ex.: um pedido contraposto
apresentado pelo réu).
Há, ainda, a possibilidade de o réu ingressar com uma
cautelar de arresto em face de outro réu, havendo a exclusão do credor. Por
exemplo, nos casos de uma ação contra o devedor principal e o fiador, esse
último poderá entrar com uma cautelar de arresto para preservar o seu direito
de regresso.
O Ministério Público, como fiscal da lei, não poderá
ingressar com ação de arresto. Existe, entretanto, uma corrente minoritária que
defende essa legitimidade, dependendo da natureza da demanda.
·
Interesse para interposição do arresto: a regra geral é que basta o requerente afirmar a
possibilidade ou risco de não-satisfação do crédito para que ele possa interpor
o arresto. Não cabe cautelar de arresto, porém, em face do devedor insolvente,
visto que a finalidade da cautelar é assegurar o pagamento de uma dívida. Logo,
se o devedor for declarado insolvente, a medida cautelar para o caso de haver
dilapidação de bens será a cautelar de seqüestro.
Contra a Fazenda Pública não se pode, em regra,
interpor uma cautelar de arresto. Quando há o rompimento da ordem de pagamento
dos precatórios, o Código prevê uma cautelar de seqüestro que tem natureza de arresto.
3.1.2. Devedor que se submete ao arresto
O Código relaciona três espécies de devedores:
Art. 813. O arresto tem lugar:
I - quando o devedor sem domicílio
certo intenta ausentar-se ou alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a
obrigação no prazo estipulado;
II - quando o devedor, que tem
domicílio:
a) se ausenta ou tenta ausentar-se
furtivamente;
b) caindo em insolvência, aliena ou
tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas
extraordinárias; põe ou tenta pôr os seus bens em nome de terceiros; ou comete
outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar
credores;
III - quando o devedor, que possui bens
de raiz, intenta aliená-los, hipotecá-los ou dá-los em anticrese, sem ficar com
algum ou alguns, livres e desembargados, equivalentes às dívidas;
IV - nos demais casos expressos em lei.
Analisaremos, a seguir, cada uma das hipóteses
mencionadas.
a) Devedor sem domicílio certo
O devedor
se submeterá ao arresto quando não pagar a dívida no vencimento, quando tentar
se ausentar de modo a se tornar insolvente. A mera ausência do devedor, sem que
haja risco de dilapidação do patrimônio, não configura razão que autorize a
concessão da medida de arresto. Na segunda hipótese, quando o réu, que não tem
domicílio certo, alienar ou onerar bens, o arresto também pode ser deferido,
balizado no fato de que a impontualidade, somada a demora no tramite da
execução pode tornar nula a efetividade da execução.
b) Devedor com domicílio certo
O devedor
se submeterá ao arresto quando tentar se ausentar furtivamente ou quando
alienar ou onerar bens de modo a se tornar insolvente. Quando o Código fala em
“ausentar-se furtivamente”, está se referindo àquele que tenta se ausentar sem
um motivo aparente, de modo inesperado, sem dar a devida publicidade.
c) Devedor com bens de raiz
O devedor
se submeterá ao arresto desde que ele onere ou aliene os seus bens, sem deixar
outros livres e desembargados de modo a garantir os demais credores. Visa também evitar a dilapidação do
patrimônio.
d) Nos demais casos expressos em lei
Podemos exemplificar com o arresto executivo, previsto
no art. 653 do CPC, que se processa os próprios autos da execução. Trata-se de caso excepcional de arresto ex officio.
3.1.3. Requisitos para concessão do arresto
O Código de Processo Civil, no tocante aos requisitos
para a procedência da cautelar de arresto, regulamenta a situação do devedor e
regula o tipo de crédito que pode ensejar o arresto. Preenchidos os dois
requisitos, o mesmo será permitido. Nos
termos do art. 814 do CPC, temos que:
I
- prova literal da dívida líquida e certa;
II - prova documental ou justificação
de algum dos casos mencionados no artigo antecedente.
Parágrafo único. Equipara-se à prova
literal da dívida líquida e certa, para efeito de concessão de arresto, a
sentença, líquida ou ilíquida, pendente de recurso, condenando o devedor ao
pagamento de dinheiro ou de prestação que em dinheiro possa converter-se.
Os dois requisitos acima devem estar conjuntamente
presentes para ensejar a concessão da cautelar em análise. De acordo com o Código de Processo Civil, o
crédito preservado é o crédito literal, líquido e certo. A redação do inciso I
deste artigo não foi muito feliz, uma vez que, se essa redação fosse levada ao
pé da letra, dificilmente o requerente conseguiria obter a concessão do
arresto, pois somente teria direito a ação cautelar quem já tivesse direito a
ação executiva, e não é essa a pretensão do legislador quando idealizou o
arresto. Portanto, o entendimento
prevalente é de que deve haver prova da possibilidade da existência da dívida
para autorizar a concessão da medida de arresto.
Equipara-se a um crédito nessas condições uma
sentença, líquida ou ilíquida, sujeita a recurso, segundo entendimento já
arraigado na doutrina, e recentemente corroborado pelo atual texto do artigo
814 do Código de Processo Civil, com as alterações da Lei n. 10.444/02. Assim,
com base nestas sentenças, o credor pode ajuizar cautelares de arresto, sejam
preparatórias ou incidentais.
Quando o Código aborda literalidade do crédito, o que
se exige é que o crédito esteja comprovado documentalmente. Não há requisitos
no Código Civil sobre o documento que comprova o crédito: então, qualquer
documento poderá ser usado para sua comprovação.
Quando a liquidez do crédito é mencionada, está se
exigindo que o requerente da cautelar informe qual o montante da dívida, ou
seja, quanto ela representa em dinheiro. Parte da doutrina entende que basta o
requerente apresentar parâmetros que se aproximem o máximo possível do valor
real da dívida.
Assim, quando cita certeza, significa que esse crédito
deve ter uma forte plausibilidade, uma forte possibilidade de existir.
3.1.4. Características
Gerais Relativas à Eficácia e Procedimento do Arresto
O Código de Processo Civil aproxima muito, na
regulamentação, o arresto da penhora. O Código dispõe que o arresto se converte
em penhora e que ao arresto aplicam-se, subsidiariamente, as regras relativas à
penhora. Esses dispositivos do Código de Processo Civil têm a finalidade de
dispor que o arresto, ordinariamente, terá eficácia até a fase de penhora e que
as normas relativas à penhora aplicáveis ao arresto serão aquelas compatíveis
com este.
·
O Código de
Processo Civil tem dois dispositivos que tratam de hipóteses em que se
suspendem o arresto e de hipóteses que cessam a sua eficácia: Suspende-se o
arresto com (CPC, art. 819):
-
pagamento da
dívida;
-
depósito da
quantia devida;
-
prestação de
caução idônea;
-
apresentação de
fiador.
·
Cessa a
eficácia do arresto com (CPC, art. 820):
-
pagamento da
dívida;
-
novação;
-
transação.
Com o pagamento da dívida, cessa a eficácia do
arresto, não havendo que se falar em suspensão. Parte da doutrina, com o
objetivo de justificar o antagonismo desses dois dispositivos, elaborou duas
explicações.
A primeira, no sentido de que se suspende a medida
quando há pagamento em cheque até a compensação do mesmo. A lei, entretanto, é
clara ao expor que o pagamento só estará efetivado com a compensação do cheque;
não há, então, que se falar em suspensão, mas sim em cessação de eficácia do
arresto.
OBS.: Art. 818. Julgada procedente a ação principal, o arresto se
resolve em penhora.
3.1.5.
Procedimento da Cautelar de Arresto
O Código de Processo Civil não trata dentro do
capítulo do arresto de todos os atos processuais que comporão essa cautelar,
visto que as regras gerais são as mesmas das cautelares inominadas. Há, porém,
algumas regras específicas aplicadas ao arresto.
Na petição inicial, nos fatos e fundamentos, o
requerente deve provar que preenche os requisitos para requerer o arresto. Em
relação à liminar, esta poderá ser concedida após a audiência de justificação,
que será feita sem a presença do requerido, se houver necessidade.
O crédito não será provado na audiência de justificação,
devendo ser provado documentalmente, tendo em vista a exigência de ser o
crédito literal.
O juiz concederá o arresto, independente de
justificação, quando o credor oferecer caução idônea ou quando o requerente for
a União, os Estados ou Municípios, nas hipóteses previstas em lei. O juiz,
entretanto, não ficará vinculado a este dispositivo, que serve apenas como
parâmetro ao julgador.
3.1.6.
Execução do arresto
Manda o art. 821 que sejam aplicadas ao arresto as
disposições referentes à penhora, não alteradas na seção I do Capítulo II do
Livro III.
A forma de executar-se o arresto, é, por isso, a mesma
da penhora, ou seja, “mediante a apreensão e depósito dos bens” com lavratura
do respectivo “auto” (art. 664), com os requisitos do art. 665. Emprega-se,
quando necessário, a força policial (art. 579).
A maior diferença prática entre a execução das duas
medidas reside no fato de que o arresto é executado de plano, sem prévia
citação ou intimação do réu.
A decisão que decreta o arresto, na linguagem de Pontes
de Miranda, é mandamental, Independentemente do ordinário procedimento de
execução forçada, ele se cumpre por si mesma, gerando a imediata expedição do
mandado do arresto.
Não há, no mandado de arresto, preceito algum: nem
prévia intimação do réu para adimplir uma obrigação, pois na verdade nem sequer
existe, de fato, da parte dele o dever jurídico de acautelar os interesses do
credor, nem a citação para solução do débito, pois não tende a ação cautelar à
satisfação do crédito do autor. Não ocorre, tampouco, a concessão de um prazo
para nomeação de bens pelo devedor.
3.1.7. Depositário
O deposito dos bens arrestados é elemento essencial da
medida, do mesmo modo do que se passa com a penhora.
O fim da tutela, in
casu – preservação e conservação de bens para garantir futura execução –
ficaria frustrado, não houvesse um responsável pela guarda do objeto afetado.
Observados os critérios do art. 666, a escolha do
depositário pode ser feita previamente pelo juiz, caso em que sua indicação
contará do mandado do arresto; ou, como é costumeiro, pelo próprio oficial de
justiça encarregado da diligência, caso em que a nomeação contará do auto de
arresto (art. 665, n° IV).
O réu não está excluído da possibilidade de assumir o
encargo de depositário desde que haja concordância do autor (art. 666, §1°).
Nos casos de imóveis, salvo recusa dele, a regra é a escolha do próprio réu
para o munus, por princípio de
economia e por determinação expressa do art. 659, §5°.
Em qualquer hipótese, o depositário deverá firmar o autor
de arresto, dando recibo dos bens confiados à sua guarda.
3.1.8. Efeitos do arresto
Com o arresto surge uma nova situação jurídica para o
bem apreendido, que fica materialmente sujeito à guarda judicial e,
juridicamente, vinculado à atuação da prestação jurisdicional objeto do
processo principal.
Decorrem, portanto, do arresto, dois efeitos
importantes:
a)
A restrição
física à posse do dono, já que o objeto arrestado passa à guarda do depositário
judicial;
b)
Imposição de
ineficácia dos atos de transferência dominial frente ao processo em que se deu
a constrição.
Observe-se, porem, que a ineficácia não se confunde com nulidade, nem impede que seja válida
a alienação do bem; apenas faz com que o ato praticado seja irrelevante para o
processo, ou seja, faz com o bem transferido, embora integrado no patrimônio do
adquirente, conserve a vinculação ao arresto e aos destinos do processo a que
serve a medida cautelar.
3.2.
SEQÜESTRO
A situação é assemelhada ao arresto. Na cautelar de
seqüestro também há a constrição de bens; entretanto, recairá sobre
determinados bens que são objeto da ação principal. Podem existir duas
finalidades na constrição de bens na cautelar de seqüestro: a preservação do
bem objeto da ação principal e o seqüestro como mecanismo para fazer cessar
rixas, ou seja, preservar o bem e as partes de uma situação que foge da
normalidade.
Na lição de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR o seqüestro
“consiste na apreensão de bem determinado, objeto do litígio, para lhe
assegurar entrega, de bom estado, ao
que vencer a causa”.
Conforme PINTO FERREIRA, o seqüestro “é a apreensão judicial de bens imóveis, semoventes e móveis, tal como no
arresto, diferenciando-se deste último
porque os bens a serem apreendidos devem
ser litigiosos”.
A medida cautelar não está obrigatoriamente vinculada
a uma futura execução para entrega de coisa certa. Pode haver execução lato sensu, como pode não haver qualquer
espécie de execução. No sistema processual brasileiro, dentro do Livro das
Cautelares, o seqüestro será uma medida cautelar, preparatória ou incidental,
mas sempre de natureza cautelar, não havendo hipótese de antecipação de tutela.
O Código de Processo Civil adota um procedimento
assemelhado ao do arresto, ou seja, relaciona os casos em que o seqüestro será
deferido. Parte da doutrina entende que esta relação é exemplificativa, mas
essa posição não é consolidada.
3.2.1
Admissibilidade do seqüestro:
Segundo o art. 822 do CPC, é admissível o seqüestro:
·
De bens imóveis,
móveis ou semoventes nas ações reivindicatórias ou possessórias quando existir
o risco de dilapidação ou de rixa. Apesar de o Código tecer considerações sobre
ações reivindicatórias ou possessórias, nada impede que a parte ingresse com
cautelar preparatória.
A litigiosidade refere-se tanto à ação já posta em
juízo quanto ao caso que ainda aguarda ser submetido a apreciação
judicial. Quando o Código se refere a dilapidar, deve englobar todo e qualquer
ato ou omissão que coloque em risco o bem, ou seja, tudo que coloca em risco o
objeto da demanda será objeto da cautelar de seqüestro. Desde que a coisa
litigiosa esteja ao abandono, ou correndo risco de perecimento, não há que se
preocupar com a natureza da ação principal e torna-se perfeitamente lícito que
a parte interessada lance mão do seqüestro como medida acauteladora do seu
direito.
Assim, por exemplo, poderá admitir-se o seqüestro em
caso de ação que verse sobre pretensão contratual de restituição de coisa, como
nos contratos de locação.
Na probabilidade do seqüestro entram, ainda, as ações
hereditárias, como o inventário e a partilha, a petição de herança e a colação.
Quando ocorrerem os pressupostos do art. 822, I, herdeiro ou cônjuge
interessados na sucessão poderão utilizar o seqüestro contra o próprio
inventariante, como meio de garantir ou preservar a integridade dos bens até a
partilha.
Voltando ao texto legal, vemos que art. 822, n° I,
prevê a admissibilidade do seqüestro da coisa litigiosa em duas circunstâncias
bem diferentes: quando houver necessidade de prevenir rixas ou evitar danificações.
Ao coibir as rixas entre os litigantes, a lei está
preocupada com a paz social, objetivo maior do processo.
Aqui “não é a coisa que corre risco, mas as pessoas
que ela aproxima. A proteção cautelar visa diretamente à tutela das pessoas, da
qual a medida de apreensão da coisa é, na espécie, apenas instrumento.
O conceito de danificação como ameaça sofrida pelo bem
litigioso deve ser entendido em sentido lato (danificação jurídica), de modo a
compreender não apenas a deterioração física, mas também o seu desaparecimento
ou desvio, casos em que as danificações referir-se-ão ao direito ou interesse
das partes e não à materialidade do bem.
O receio de rixas e danificações deve, outrossim, ser
“fundado”, isto é, sério, inspirado em dados objetivos que autorizem a admissão
de sua probabilidade.
Indaga-se: É possível seqüestro de direitos?
Parte
dominante da doutrina entende que sim, visto não haver motivo para não se fazer
uma interpretação mais extensa (ex.: seqüestro de quotas de empresa). Em sua
lição, HUMBERTO THEODORO JÚNIOR ensina que é perfeitamente é possível o
seqüestro de títulos de
crédito, bem como ações de sociedade
anônima.
·
Sobre frutos e
rendimentos do imóvel reivindicando quando o réu, após ter sido proferida
sentença sujeita a recurso, os estiver dissipando. No caso, o Código está
gerando uma presunção de que se o réu já foi condenado, e a partir desse
instante pode continuar a receber esses frutos ou rendimentos, mas esses frutos
ou rendimentos não poderão ser utilizados sem garantia, ou seja, o réu perde a
livre disponibilidade dos frutos e rendimentos. O Código exige, entretanto, a
existência da sentença;
·
Nos casos de
dilapidação de patrimônio por parte de um dos cônjuges nas ações de separação
ou anulação de casamento. O seqüestro, neste caso, será admissível quando se
tratar de bens do casal ou do requerente da cautelar. A dilapidação
abrange tanto onerar quanto destruir os
bens. O seqüestro de bens não pode impedir os atos de administração ou de
gestão ordinária do patrimônio. A dilapidação se refere a prejuízos
intencionais à meação.
·
nas demais
hipóteses previstas em lei. A título exemplificativo, pode-se citar: seqüestro
de livros e documentos do falido; seqüestro de produto de crime; seqüestro nas
possessórias em que tanto o requerente quanto o requerido exercem a posse a
menos de ano e dia.
3.2.2.
Procedimento da Cautelar de Seqüestro
O Código trouxe as regras específicas que devem ser
aplicadas ao seqüestro e subsidiariamente às regras do arresto.
Na petição inicial, o requerente deve demonstrar os
fundamentos da cautelar, devendo, obrigatoriamente, individualizar o bem a ser
seqüestrado. Compete ao requerente, ao pleitear o seqüestro, dizer de que forma
ele pretende que seja concretizado, visto que o seqüestro pode se dar em suas
mãos, de terceiros ou do próprio requerido.
Pleiteado o
seqüestro, o juiz poderá deferir liminarmente ou após audiência de
justificação. Deferido o seqüestro, o juiz nomeará um depositário de comum
acordo entre as partes ou à parte que oferecer melhores garantias e prestar
caução. Essa regulamentação somente pode ser encarada de maneira
exemplificativa, visto que o juiz poderá nomear um terceiro sem que estejam as
partes de comum acordo, não limitando o julgador. O Código também dispõe que os
bens serão entregues ao depositário. No mais, seguem-se as mesmas regras da
cautelar de arresto e das cautelares inominadas.
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