Direito Empresarial
03-04-12
Teoria subjetiva
Teoria objetiva
Ato de comércio subjetivo
Ato de comércio objetivo
Ato de comércio por conexão
Circulabilidade/especulação
Teoria empresarial
Exceções
Compra e venda de imóveis
Atividade agropecuária
Profissional liberal
Em
matéria comercial estávamos vendo a teoria subjetiva, a objetiva e ficamos de
ver a empresarial.
Vimos
que nos arts. 18, 19 e 21 do Regulamento 737 estava disciplinada o que era a
mercancia, com uma lista exemplificativa de atos de comércio.
Nos
atos de comércio subjetivos ou por natureza é imprescindível a presença de um
comerciante. O registro é essencial para a teoria subjetiva, e dispensável para
a objetiva.
Outro
ato de comércio objetivo é aquele que, independente de quem pratica, será
sempre qualificado como ato de comércio. A matéria será comercial e o Direito
Empresarial será aplicado. O ato de comércio é assim classificado em virtude da
determinação da lei. O negócio é ato de comércio em massa. São atos de comércio
objetivos, e tratam de emissão e circulação de títulos de crédito em massa. O
efeito sobre o mercado é grande, então determina-se que são atos mercantis e
daí deve-se aplicar um Direito próprio, que é o Direito Cambiário, o Direito
dos títulos de crédito. Independente de quem pratica, será sempre matéria mercantil,
o ato será sempre de comércio, e a legislação aplicada será sempre o Direito
Mercantil, em sua espécie o Direito Cambiário.
Vamos
agora aos <b>atos de comércio por conexão</b>.
Atos
de comércio por conexão são aqueles que facilitam a realização de outros atos
de comércio. Existem como facilitadores da prática de outros atos de comércio.
Em
todos os manuais de Direito Empresarial brasileiros veremos que atos de
comércio por conexão são os que facilitam outros. Exemplo: contrato de compra e
venda de um freezer, feito por um dono de bar, para vender mais cerveja. Está errado.
Por quê? O exemplo está errado. Realmente facilita outros atos de comércio, no
caso, atos de compra e venda de cerveja. A compra do freezer é ato de comércio,
porque comprou não como consumidor, mas como instrumento para o exercício de
sua atividade empresária. O negócio jurídico é uno e indivisível. Então o sujeito
foi ao Carrefour e comprou um freezer, levou para seu restaurante para gelar a cerveja.
Não é um ato de comércio por conexão, ao contrário do que dizem os manuais. É
um ato de comércio subjetivo ou por natureza, porque a relação jurídica é una e
indivisível. O Carrefour é uma das partes dessa relação jurídica. É um comerciante
coletivo. Quando age nesse negócio jurídico, ele age no exercício de sua
atividade. Se, dado o caráter uno do negócio jurídico, se uma das partes age no
exercício de sua atividade, então o ato é de comércio por natureza, não por
conexão.
Além
disso, é matéria mercantil pelo critério subjetivo. Na teoria objetiva eu
também poderia qualificar como ato mercantil, não por conexão, mas por
natureza. Ato de comércio por conexão é aquele praticado para facilitar a
prática de outros atos de comércio.
Se
o ato for de comércio por natureza para uma das partes, será para a outra
também, porque o negócio jurídico é uno e indivisível. A não ser que busquemos
a qualificação da excepcionalidade. Quando? Na relação de consumo. Para uma das
partes, aquele ato seria um ato de comércio por natureza, que é para o
vendedor. Mas o comprador consumidor, se qualificado como tal, o negócio
jurídico é uno e indivisível, e vamos qualificar esse negócio jurídico não como
mercantil, mas como de consumo. Isso é, na verdade, o exercício da <i>vis
atrativa</i> de um Direito mais especial para seu campo para a solução de
um conflito de execução defeituosa ou inexecução de um negócio jurídico. É uma
excepcionalidade. Na regra, se para uma das partes o ato é mercantil, o ato é
mercantil. Não sendo consumo nem relação de emprego, então, na regra, se para
uma das partes for ato de comércio por natureza, para todas elas será ato de
comércio por natureza. Essa é a regra.
Exemplo
de ato de comércio por conexão: locação de galpões entre duas partes não
empresárias, ou com pelo menos uma não empresária, com o objetivo de estocar
produtos eletroeletrônicos para fins de posterior distribuição. Se o importador
dos eletroeletrônicos não dispõe de um local para acondicionar seus produtos recém-chegados,
ele poderá contratar com alguém que disponha de um galpão, seja este empresário
ou não, remunerando-o pelo uso do imóvel. Não confundir com <i>armazenagem</i>,
pois esta pode ser exatamente a atividade profissional de alguém, o que será,
neste caso, atividade mercantil. Por outro lado, quem simplesmente é
proprietário de um galpão sem uso e pretende com ele auferir renda poderá
locá-lo, sem que seja, por isso, qualificado como empresário.
Se,
por acaso, quem loca os galpões fosse um especialista, tal como uma
imobiliária, então teríamos um ato de comércio por natureza? Deveria ser o
caso, mas não é por expressa determinação legal. É uma exceção legal. Deveria
porque estariam presentes os requisitos de circulabilidade e especulação.
Outro
exemplo: quando vamos comprar refrigerante, notamos que alguns estão
acondicionados em freezers com sua própria marca estampada. Coca-Cola faz muito
isso. A Coca empresta o freezer para quem queira comercializar seus produtos,
com a condição de que não acondicionem produtos de nenhuma outra marca lá. Esse
comodato pode ser classificado como um ato de comércio por conexão.
Mais
um exemplo: transporte de mercadorias. Ato de comércio por natureza ou por
conexão? É uma atividade mercantil por natureza. Exceto o transporte eventual,
que não é mercantil, pois não tem a característica da especulação. Mas temos
que definir qual é a eventualidade: o sujeito fez frete com sua pick-up uma
vez. Cobrou determinado preço. Daqui a duas semanas é contatado por alguém
indicado pelo primeiro cliente. “Tudo bem, diga aí o endereço.” E uma terceira
vez. Isso foi de eventual para habitual. Passou a ter a característica da
especulação e, portanto, é mercantil.
Repetindo,
então, os tipos de atos de comércio: subjetivo ou por natureza, objetivo e por
conexão. Finalmente, nós sabemos que, para a teoria objetiva, é essencial a
presença dos dois requisitos: circulabilidade e especulação.
<h4>Teoria
empresarial</h4>
Outra
teoria á a empresarial. É a terceira teoria de delimitação da matéria
empresarial.
O
que é a empresa? <i>Organização concreta de fatores produtivos como valor
de posição no mercado</i>. Teoria de Orlando de Carvalho escrita em 1967.
O Professor da Universidade de Coimbra escreveu somente sobre isso um trabalho
de 980 páginas! É a definição da teoria empresarial do Direito Europeu
Continental. É uma teoria ainda não adotada no Brasil. O professor entende que esta
é <b>a</b> verdadeira teoria empresarial. Não vamos aprofundar
muito nela aqui, mas a ideia é que, cumpridas determinadas circunstâncias de
mercado, a atividade empresária ganha uma autonomia com relação ao empresário,
seja esse empresário individual ou coletivo. Não o empresário e não a pessoa
jurídica. Empresário geralmente coletivo, porque pressupõe grandes
investimentos de capital. A empresa passa a deter, ela mesma, um valor de
mercado.
Exemplo
para entendermos claramente: quando alguém vai realizar um negócio com, por
exemplo, o Grupo Votorantim, esse alguém imagina que está fornecendo um bem
para o grupo econômico ou para um empresário específico? Para o grupo. Quando
alguém realiza um contrato de fornecimento, de aquisição de um bem, uma relação
de emprego, um contrato de trabalho, aquilo já é uma massa patrimonial de
negócios, e negocia-se com essa massa patrimonial. O que o sistema jurídico
entende? Na hora que o credor for buscar a satisfação de seu crédito, ele
buscará perante quem? Com o empresário específico, o obrigado direto, ou
perante qualquer membro do grupo? Pelo sistema jurídico posto, se realizei
contrato de financiamento com o Grupo Votorantim, quem assumiu a obrigação foi
o obrigado direto, mesmo que pessoa jurídica, mas um empresário específico. Um
dos membros do grupo. Ao buscar a satisfação do crédito, tenho que buscar o
sistema normal de assunção de responsabilidade. Sem fraude, devo buscar dele.
Orlando
fez o quê? Entendeu que: “não, cumpridas determinadas circunstâncias de
mercado, que é exatamente aquela massa patrimonial, ela, por ela mesma, passa a
deter um valor diferenciado no mercado.” Daí a expressão “como valor de posição
no mercado”. Ela adquire uma “personalidade própria” e, quando alguém realiza
um negócio, não realiza imaginando que está negociando com a pessoa A, B ou C, mas
sim que realizou um negócio mas com aquele grupo econômico, que não é detentor
de personalidade própria no sistema jurídico societário que temos.
A
massa patrimonial tem tanta importância mercadológica que se desprende das
pessoas a que estava vinculada originariamente. Normalmente eram pessoas
jurídicas. Então, na verdade, quando se desprende, Orlando de Carvalho entendeu
que podemos dizer que a empresa, a atividade em si, que não é o estabelecimento
comercial, a pessoa jurídica, os sócios ou os instrumentos, ganhou importância
no mercado. Se ganhou, ela pode ser dotada de personalidade. Então nasce, daí,
dependendo de determinadas circunstâncias de mercado, uma nova pessoa de
Direito.
Teremos
três espécies de pessoas: pessoa física, pessoa jurídica e a <b> empresa
personificada</b>, que não temos aqui. Não existe no Brasil essa
terceira. Existe aonde? No Direito Europeu Continental inteiro. Para os que
quiserem entender melhor, basta ler o livro Critérios e Estruturas do Estabelecimento
Comercial. Essa obra faz a análise da teoria empresarial, que foi adotada
depois no Direito Europeu Continental.
Qual
o objetivo disso? Pegar uma massa patrimonial e dotá-la de personalidade. Para
quê? Acontece no sistema jurídico brasileiro? Na falência, no levantamento dos
bens do falido, quando damos personalidade própria temporária, que inclusive
pode realizar negócios. Tem que parar a atividade, mas, na exceção, há a
necessidade de continuidade de determinados negócios jurídicos até a liquidação
final. É uma universalidade de direito. Acontece também no inventário, o
patrimônio do <i>de
cujus</i> fica vinculado à ideia de morto, para haver a liquidação de
todos os bens.
E
também temos um caso no Brasil, recente, que nos permite a constituição de outra
universalidade que a lei previu, então é universalidade de direito, que é
consensual, portanto também é uma universalidade de fato. O que é? Promover a
afetação patrimonial à sua pessoa limitando sua responsabilidade. É a lei nova
que temos que permitiu a constituição da empresa individual de responsabilidade
limitada. É um caso recente em que o sistema jurídico passou a permitir a
vinculação de uma massa de patrimônios a determinada pessoa física limitando
sua responsabilidade. Não conseguíamos entender a teoria do patrimônio
inseparável: a possibilidade de vinculação de uma massa patrimonial a
determinado ente limitando responsabilidade, de forma individual. Entendíamos
de forma coletiva, na sociedade limitada ou na sociedade anônima. Agora isso
pode ser feito na pessoa física. Quando eu criar uma, eu arquivo na Junta
Comercial! O limite mínimo é de 50 salários mínimos, recém-aprovado, mas não
ainda em vigor. A lei nasceu com a regra de 100 salários mínimos como limite
inferior, o que é um absurdo mesmo. Na prática, ninguém faria. O sujeito faria
o que fazia antes: estipulava que 0,1% do capital social de 500 reais será de
um laranja. Professor entende que o sistema brasileiro é de livre constituição.
Mas deve-se estabelecer um patrimônio. Você poderia limitar em R$ 3,00, sem
problema. A única coisa é que o credor só vai analisar que seu patrimônio
vinculado à atividade é esse e jamais fará negócio com você. Não tem problema
nenhum.
Teoria
empresarial, então, é aquela. Organização concreta de fatores produtivos como valor
de posição no mercado. Não está adotada no Direito Brasileiro. O professor só
nos trouxe por notícia, nada mais. O que temos que saber é: por mais que
afirmemos na lei, continuamos com as mesmas definições de matéria comercial.
Não temos a classificação da terceira pessoa do sistema jurídico brasileiro.
Continuamos só com a pessoa física e jurídica, e não estamos nem a caminho de
instituir a terceira pois há poucos no Brasil que entendem como isso funciona.
Note
que o indivíduo pode eleger parte de seu patrimônio e afetá-lo, vinculá-lo ao
exercício da atividade. Antes da existência do empresário individual de
responsabilidade limitada, sempre haveria, para o exercício da atividade
empresária de forma individual uma confusão patrimonial. Sem a afetação
patrimonial à atividade desenvolvida, ocorrerá a confusão patrimonial. A
confusão patrimonial para os civilistas é um defeito; para os mercantilistas,
um instituto de Direito Mercantil. É a mistura, a não possibilidade de
identificação do patrimônio das pessoas, seja a pessoa física e a atividade
mercantil desenvolvida através de uma firma individual.
Então
existe uma confusão. Qual é o efeito? Responsabilidade ilimitada. O terceiro
credor não consegue identificar o que é o patrimônio do Daniel pessoa física e
o que é o patrimônio do Daniel vinculado à atividade empresária. A atividade é
desenvolvida de forma individual. A lei traz o quê? Você, Daniel, que exerce o
comércio em nome próprio, pode pretender o registro próprio na Junta Comercial,
onde você determine que uma massa patrimonial, que tenha valor mínimo de cem salários
mínimos se desvincule de seu patrimônio pessoal particular e se vincule a essa
atividade por você desenvolvida. Então vou contabilizar a entrada patrimonial
de 100 salários mínimos, em dinheiro ou bens, valores que estarão vinculados à
minha atividade. Quando isso acontece, o efeito é a limitação da
responsabilidade.
Isso
leva à ideia de sociedade unipessoal! Associar-se a si mesmo. Uma coisa sou eu
pessoa, e outra sou eu como empresário individual com limitação de
responsabilidade. Ainda não temos a regulamentação aqui, mas o efeito é o
mesmo.
Na
Lei de Incorporações podemos ter as SPEs, as sociedades de propósito
específico, que não são nada. São uma sociedade anônima ou limitada em que se
pega uma massa patrimonial do empresário coletivo originário, que resolve realizar
uma obra nova, com vinculação do patrimônio originário à obra nova. Vinculou-se
e afetou-se. Qualquer problema, seja fiscal, tributário, trabalhista ou
obrigacional pessoal será pago pela própria SPE. Isso foi o que nos permitiu
evoluir e chegar ao exercício da atividade empresária individual com limitação
da responsabilidade.
Teoria
empresarial existe no Brasil? Não. Usamos aqui, ao mesmo tempo, a teoria
subjetiva e a objetiva.
Concluindo:
o que houve com a matéria comercial? No Brasil, ela é hoje definida assim: todo
e qualquer ato ou negócio jurídico praticado com circulabilidade e especulação seriam,
a partir daí, classificados como negócios mercantis, consequentemente o Direito
Empresarial seria aplicado para a solução de conflitos. Ocorreu um alargamento
enorme da matéria comercial no Direito Brasileiro. Adotamos, ao mesmo tempo, a
teoria subjetiva e a teoria objetiva.
Como
vamos analisar, então? Temos um contrato de compra e venda. É um negócio
jurídico. É relação de consumo? Não. Começamos por aqui, como já vimos no
caminho a percorrer. É relação de emprego? Não? Se não é, vamos ver se é uma
relação mercantil. Para saber se é uma relação mercantil, o que vamos olhar:
tem circulabilidade e especulação? Tem? Então é mercantil. Se circulabilidade e
especulação, que são requisitos cumulativos, passamos para a fase seguinte, e
provavelmente será um negócio jurídico de Direito Civil.
<h4>Exceções</h4>
<b>Compra
e venda de imóveis</b>. Por determinação legal não é atividade mercantil.
O legislador entendeu que a atividade desenvolvida por uma imobiliária não é mercantil,
mas civil, então está afastada do Direito Empresarial. A pergunta é: por quê?
Quando
o legislador adotou a compra e venda de imóveis como atividade não empresária, ele
entendeu que faltava o requisito da circulabilidade. Mas existe especulação?
Sim. É o mercado mais especulativo? Não. Os negócios mobiliários são mais
ainda. Mas o legislador entendeu que não existiria circulabilidade, que era a
mudança de espaço físico, e o imóvel não pode sair do lugar. Um equívoco, que
perdura ainda hoje, mas que o legislador, de certa forma, o corrigiu na lei que
trata das construções por incorporação em 1974. Naquele caso, o legislador
entendeu a bobagem que havia feito, e corrigiu o problema dizendo: “a compra e
venda de imóveis continuará sendo não mercantil [...]” Na época havia forte
lobby dos cartórios para que continuasse não mercantil. “[...] mas a construção
por incorporação será atividade mercantil.” Então a construtora desenvolve uma atividade
mercantil, sujeita ao Direito Empresarial. Se a construtora que trabalha com
incorporação está sujeita à falência, e ao processo especial de liquidação. Essa
é uma atividade estritamente mercantil; o legislador corrigiu em parte. Bastaria
a mera tradição simbólica, a entrega das chaves.
Para
transferir um imóvel, preciso de um requisito essencial da lei, que é o registro,
mas não para transferir um estabelecimento comercial? O estabelecimento
comercial pode ter um valor 500 vezes maior que um imóvel. Na maioria das vezes
tem. Para transferir aquele estabelecimento não tenho requisito especial. Não é
questão de valor. O registro não é nem requisito de segurança, mas porque
previsto na legislação.
Compra
e venda de imóvel, portanto, é qualificada como atividade não mercantil. Não
faz sentido, mas o legislador corrigiu em parte. Há países em que a compra e
venda de imóveis não tem registro especial. No Brasil continua tendo.
Outra
exceção, que não é considerada como atividade mercantil é a do
<b>profissional liberal</b>. Exerce atividade mercantil? Tem circulabilidade
e especulação? Tem. A atividade desenvolvida nos escritórios de advocacia têm
especulação? Tem. Muita, em alguns. Mas tem circulabilidade? Circulação de quê?
O que se transfere é tecnologia. Todos os contratos de tecnologia são
classificados como mercantis. Transferência de tecnologia, know-how e assistência
técnica são todos contratos mercantis. Claro que há transferência e circulação
de bens. O bem que se transfere é o conhecimento. E, claro, tem especulação.
Mas
por que essa atividade não é mercantil? Não é o exercício de qualquer
profissional liberal, mas o exercício da atividade do advogado não é mercantil.
Deixemos essa interrogação.
Clínica
médica: desenvolve atividade mercantil? Médico individual age como profissional
liberal e não tem os elementos caracterizadores da empresa, que são os fatores
de produção: capital, trabalho e informação. Esta última não era elemento
essencial para a qualificação da atividade empresária. Não existiria a
organização desses fatores, portanto a atividade desenvolvida não seria
empresária. Mas no exercício da atividade médica através de uma clínica onde
exista a exploração do trabalho alheio, aí sim, haveria a possibilidade de
qualificação dessa atividade como empresária. Isso foi decidido pela primeira
vez em 1976, quando foi decretada a falência de uma clínica médica no estado de
São Paulo. De lá para cá já não temos mais dúvidas. Se há fatores de produção
de forma organizada, então podemos falar na qualificação da atividade como
empresária.
Todo
hospital exerce atividade empresária? Não. Hospital sem intuito de lucro não
desenvolve atividade mercantil. Beneficência Portuguesa, Santas Casas, entre
outros.
O
que se precisa fazer, então, é fazer a prova para qualificar a atividade como
empresária, e assim demonstrar que ela está sujeita à falência.
Definimos
a ideia de que a advocacia não é mercantil porque tivemos lobby. Se estivermos
lidando com um escritório de jovens advogados que se sentem mais empreendedores
do que juristas, que focam exclusivamente no ramo da desafetação de imóveis
para posterior venda a preço mais elevado, isso deveria ser uma atividade
mercantil. Mas, mesmo que provemos que a atividade deles é exclusivamente essa,
para então querer qualificar como empresária e, daí, requerer a falência, a
atividade advocatícia jamais pode ser considerada como mercantil por lobby da OAB.
Por isso deixamos aquele ponto de interrogação há pouco. Por que a atividade da
advocacia é qualificada como atividade não empresária? Por determinação legal.
Mas por que definimos na lei que essa atividade é não empresária? Na opinião do
professor, exclusivamente por causa de lobby. Enquanto os controladores da
Ordem dos Advogados do Brasil tiverem mais de 60 anos estiverem lá, continuará
assim. Quando a geração como a do professor ascender, pode ser que isso se
modifique, espera ele. Isso porque vivemos num mundo mais corporativo,
desenvolvendo atividade corporativa e mercantil. Há outros países em que a
atividade do advogado pode ser qualificada como empresária. Pode-se constituir
uma partnership que tenha por objeto o exercício da advocacia mas continuar
como sociedade anônima, até de capital aberta. No Brasil, ainda restringimos a
atuação do empresário individual nesse setor. Reserva de mercado. Professor
defende que a atividade advocatícia fosse estritamente mercantil.
E
qual a forma que alcançamos para conseguir desenvolver essa atividade como
empresária? Tem jeito? Tem. Constituindo não uma sociedade limitada, mas uma
sociedade anônima, em que o critério para a qualificação da atividade como
empresária não será o do objeto, mas o da forma. Qualquer sociedade constituída
sob a forma de S/A é considerada mercantil independente do objeto. Atenção,
então: no Brasil, para a qualificação de uma atividade coletiva como empresária
o critério que vigora é o critério do objeto. Analisando o objeto definimos se
é mercantil ou não pela matéria comercial. Uma sociedade por quotas pode ou não
ser empresária. Podemos ter uma sociedade por quotas não empresária. O critério
é a regra: o critério do objeto. Temos que ver o objeto social, analisá-lo e
ver se tem previsão de matéria comercial ou não.
Temos
uma exceção no Direito Brasileiro em que não se observará o critério do objeto,
mas o da forma, que é a sociedade anônima. Se a atividade for desenvolvida
através de sociedade anônima, o critério que vigora não é mais do objeto e sim
o da forma. A atividade será sempre mercantil, ainda que seu objeto não seja
mercantil. Se criarmos amanhã aqui o “Clube do Livro” dos alunos do nono
período de Direito do CEUB, esse objeto será mercantil? Não; talvez seja
cultural, dependendo dos livros. Mas se constituído sob a forma de sociedade
anônima, essa atividade é mercantil, portanto empresária. É exceção, e não a
regra. Na exceção temos o critério da forma. Na regra, o do objeto.
E
por que o legislador fez isso com relação à S/A? Besteira? Neste caso não. A
sociedade anônima é um “fazedor”, pelo menos em tese, de atos de comércio
objetivos, em massa, que é a possibilidade de emissão e circulação de títulos
de crédito, de ações. Já passamos pela discussão de serem as ações títulos de
crédito. Como a sociedade anônima pode fazer isso, então neste caso não vamos
nem nos preocupar com o objeto. Não interessa se é mercantil ou não. Fez-se
dessa forma porque assim já se protege o mercado, é uma questão de segurança
jurídica. Então, não há nem possibilidade de se aplicar o Direito Civil. Aplica-se
o Direito Mercantil Societário, mais especificamente a Lei 6404/1976, para não
ter riscos para o mercado.
E
a advocacia? É possível registrar uma sociedade de advogados sob a forma de
sociedade anônima? Não, a OAB nega o registro. Mas posso desenvolver essa
atividade registrando na Junta Comercial que, além da advocacia, exerço
consultoria contábil e de mercado? Posso. A Junta Comercial vai registrar. A
atividade será qualificada como empresária. Alguns usam consultoria jurídica
para não usar o nome “advocacia e litigância”. Assim constituiu-se uma
sociedade empresária que tenha, dentro de seu objeto, também a assessoria e
consultoria jurídica.
Usa-se
a forma de sociedade anônima para permitir o investimento de capital do mundo
inteiro. Sociedade civil é sociedade de pessoas, e todos os princípios têm que
estar vigentes. Preferimos sociedade de capitais, e não me interessa de forma
alguma quem são as pessoas, mas sim o capital. Mas é a exceção. Na regra, o
exercício da atividade advocatícia é por sociedade civil, quando por sociedade.
Vamos
em frente.
<b>Atividade
agropecuária</b>: é a terceira exceção. Por determinação legal não é
atividade mercantil. O professor é da frente parlamentar da agropecuária. É
multipartidária, organizada dentro do Congresso Nacional. O escritório presta
assessoria para a Frente.
Imaginem
a situação: alguém aqui na Torre Eiffel de Brasília monta uma bancada com duas
mesinhas, compra relógios falsificados e expõe à venda. Esse empreendedor faz
isso toda semana. Está sujeito à falência? Está. É empresário, ainda que não
tenha registro. A relação jurídica subjacente pode ser ilícita. O que a relação
jurídica posterior tem a ver com a anterior? Se empresária, nada. Se vende
cocaína não, mas se o bem for lícito, não tem problema. O cara é empresário.
Tem circulabilidade? Claro que tem. Tem especulação? Claro. Mercado altamente especulativo.
Exerce a atividade de forma habitual. É mercantil e está sujeito à falência.
Do
lado dele há outra banca, com 200 metros de comprimento. Vários empregados.
Venda direta do produtor rural para o consumidor. Essa é mercantil? Não. Por
determinação legal, não. Aí o professor começa a pensar: por quê? Tem
especulação e tem circulabilidade. No escritório do professor há um sujeito com
300 mil hectares de soja. Um dia desse o cliente do professor vendeu uma
participação de 7% por 300 milhões de dólares.
Esse
homem que “fez” a cidade. Como não havia gente para trabalhar em sua terra, ele
mesmo ajudou a construir escolas, centros comerciais, clubes e moradias no
município, assim atrairia gente e, então, poderia encontrar empregados. Ele não
desenvolve atividade mercantil, por determinação legal. Sua atividade produtiva
tem circulabilidade e tem especulação. A única explicação para a exceção é
sociológica. Na transferência de bens imóveis conseguimos entender. Por um
lado, o professor é filho de libaneses. Quando chegaram aqui, não tinham
vínculo com a terra.
A
mãe disse: não produza. Compre de quem produz e venda para quem quer comprar. Receba
um spread em função dessa diferença de interesses. É uma tecnologia de acesso a
mercado, de conhecimento de mercado. Quem produz ou industrializa sempre olhará
para essa pessoa como atravessador e outros nomes pejorativos, que “ganha
dinheiro em cima de nós!” Mas quem produz entende que não consegue alcançar o
mercado sem esse agente.
Gerar-se-ia
dinamicidade enorme na atividade agropecuária. Geraria transparência também: o
investidor também não injeta dinheiro onde não tenha uma burocracia boa. O
mundo que chegou aqui há 500 anos não estava interessado nessa transparência. É
a aristocracia rural brasileira.
Depois
tivemos no Código Civil brasileiro um artigo que vamos ver na próxima aula,
primeira coisa: art. 971.
[[[
Art.
971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão,
pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos,
requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva
sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os
efeitos, ao empresário sujeito a registro.
]]]
O
legislador abriu uma porta para que aquele que pretenda qualificar sua atividade
como atividade empresária; desde que requeira, poderá qualificar. É o empresário
agropecuário. Se a não qualificação dessa atividade com empresária gera um
bilhão de benefícios fiscais, o art. 971 é letra morta? Por que ele iria querer
a qualificação como empresário? Pensem.
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